sábado, 31 de maio de 2014

Barbosa e o risco de abraçar a política

O ministro Joaquim Barbosa anunciou seu afastamento do Supremo Tribunal Federal, por desejo de aposentadoria, mas também cedendo a ameaças que estariam sendo feitas pela sua atuação decisiva na condenação dos políticos e empresários envolvidos no "Mensalão", o processo referente à  compra de votos parlamentares durante o Governo Lula.
Não se sabe até que ponto Joaquim Barbosa fez ou deixou de fazer o jogo de interesses do ex-presidente Lula, que o nomeou para a colenda Corte, ou se agiu conforme as suas convicções pessoais. Afinal, num tribunal superior cujos membros foram, majoritariamente, nomeados por influência do Partido dos Trabalhadores - PT-, a unanimidade absoluta nas decisões seria uma burrice política. Um, dois ou três contrapontos são necessários, e Joaquim Barbosa é um deles, ao lado dos ministros Marco Aurélio Mello e Gilmar Ferreira Mendes.
O arcabouço jurídico brasileiro não difere muito dos arcabouços dos demais países desenvolvidos e em desenvolvimento, no tocante à essência da ética e da moral, cujos princípios remontam a milhares de anos antes de Cristo, bem antes do próprio Código de Hamurabi e dentro da cultura sumeriana e acadiana. O que muda no processo normativo são os aspectos relacionados à cultura de cada povo, as tais idiossincrasias culturais, que o levam a agir com rigor, permissividade, indolência, coragem, etc..
Quando Joaquim Barbosa, o primeiro negro a presidir o Supremo Tribunal Federal, procurou estabelecer procedimento rigoroso para a condenação e prisão dos envolvidos no "Mensalão", o Brasil e o próprio exterior chegaram a duvidar da capacidade do ministro de levar adiante tão ousada posição. Afinal, ele foi diversas vezes confrontado por vários colegas diante das câmeras de televisão, sendo alvo às vezes de insinuações preconceituosas na própria mídia, baseadas em sua cor, em seus hábitos populares de frequentar bares e espetáculos musicais, e até mesmo em suas dores-de-coluna.
Joaquim Barbosa cresceu como nome potencialmente candidato a cargos eletivos, entre os quais o de Presidente da República. Seu nome virou estrela nas redes sociais, mas nem isto parece ter motivado o ministro a se filiar a partido político e disputar algum cargo, hipótese que ele não elimina em suas declarações de afastamento das lides judiciárias.
Barbosa sabe que, entre a teoria e a prática de se transformar em político, existe um imenso fosso a ser superado, pois a figura de um ministro do STF impõe respeito na mídia e na opinião pública em geral, mas a figura do político está sujeita atualmente a imenso desgaste, em face da dicotomia entre as práticas existentes e as aspirações e os interesses da sociedade brasileira. De estilingue, o ministro passaria a ser vidraça, uma transformação nada confortável.
A conversão de um potencial candidato a cargo eletivo em titular de mandato requer o preenchimento de, pelo menos nas minhas contas, no meu “Manual de Campanha Eleitoral”, 22 requisitos, que variam desde a vontade de querer disputar um cargo eletivo até a estratégia de reeleição. Ou seja, a conquista e manutenção do poder político, entre a pretensão e a realização como ator, não se constituem  numa empreitada fácil, como o senso-comum imagina.
Acredito que, ponderando a respeito de suas chances numa carreira política,  até mesmo em função de suas condições físicas, o ministro fará prevalecer o seu bom- senso, mantendo-se distante da fogueira das vaidades que arde na arena política, ainda que o convençam de que os braços do povo o esperam. Dificilmente, conseguiria superar como político os marcos virtuosos que conseguiu superar como juiz.
 
 

 

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