quinta-feira, 14 de abril de 2016

Duvidando do futuro e dimensionando os prejuízos no presente

 
        Aylê-Salassié F. Quintão*
 
          Não notou ainda que você, cidadão civil, desempregado, está só. Se não se posicionar para ocupar um lugar no futuro do presente, poderá ser obrigado a aceitar o futuro que vier (Honesko,2016). O futuro, como o concebemos na imaginação,  não existe. É uma invenção discursiva cultivada desavergonhadamente por políticos profissionais, na venda de esperanças; e pelo capital ,para se reproduzir em cima do sistema produtivo e das economias alheias. Inspira-se na “fé”, cega e inibidora , dos espíritos fracos e na ganância dos invejosos. Ampara-se em carências afetivas e materiais, nas dúvidas eternas e na crença na necessidade de contribuir , como cidadão, com a conformidade pessoal,  para manter a sociedade coesa e a  previsibilidade dos ganhos. Perceber isso exige coragem e pragmatismo.
 
           Desconfiado e inseguro, o homem, carregado de frustrações na vida material desde o tal “Descobrimento”, alimenta-se, ao longo da existência,  numa expectativa final do retorno do “Salvador” ou na possibilidade de dar  uma volta por cima no outro lado da vida, após a morte, acreditando que encontrará algo diferente, como  um “paraíso edênico” -  que, para as novas gerações,já pulou do real para o virtual - um “inferno demoníaco”  ou, ainda, para os mais reprimidos, “quarenta mulheres virgens”.
 
             Não vou debruçar sobre as dezenas de autores que tem explorado a ingenuidade alheia escrevendo sobre o futuro, fazendo projeções que nunca se realizaram.  O quadro atual, não apenas brasileiro, mas também mundial, torna evidente uma “ruptura” – e não propriamente um declínio – que envolve a desvalorização das atividades dos políticos, dos religiosos, dos industriais e etc. , seguida do achatamento das oportunidades fáceis de emprego hardware oferecidas por empreendedores privados que, até aqui, tem contribuído para  inibir inteligências, “emburrecer”  o ser humano, e distanciar os homens  entre si .
 
             Nesse rastro, emergem cientistas e messias que, amparados em questões casuísticas do cotidiano,  transformam alucinações pessoais em ideologias e essas em leis (fé compulsória) até bater às portas do fanatismo.  Fazem acreditar que os homens são parte de classes sociais distintas,  e estabelecem genericamente disputas pela hegemonia, usando, como instrumentos de manobra, populações fragilizadas pela ignorância e pela pobreza. 
          
           Minha geração profissional foi inspirada na busca do emprego público ou num modelo japonês  de futuro, em que a família do trabalhador era parte do negócio. Recebia dela escola para os filhos, apoio à saúde, casa para morar, ticket de transporte,  tinha um fundo de pensão e  frequentava os mesmos lugares e clubes que os companheiros de trabalho. Era uma alienação geral do sujeito.
 
         Sem recuar ao já dado, a realidade – e não o futuro - está aí, abrindo os braços para milhares de recém-formados e desempregados . Apresenta-se para a imaginação da maioria em formas totalmente desconhecidas, instigando os sujeitos a se descobrir no meio do caos.  O novo mundo ampara-se  na inteligência artificial, nos big data e na sustentabilidade.  O primeiro  nos instiga a uma viagem para além do comum; o segundo,  nos oferece uma plataforma para a pós-modernidade; e o terceiro é  quase uma advertência: "Vai comer o quê?” Coloca um dilema, sim,  para um mundo da superprodução de alimentos, cujos resultados se vulgarizam,  de tal forma a distanciar as novas gerações dos modelos produtivos.  Divagar, esperando que o Estado vá alimentar  os 200 milhões de brasileiros não é ilusão, é suicídio.
        
         Daí, a observação: não espere fazer só o que você gosta e, com isso, atingir as metas do que imagina para si como futuro. Não espere que alguém vai dar solução para sua subsistência. Os recursos são cada vez mais escassos. Posicione-se já como visionário. Quando tiver uma boa ideia,  não a consuma no botequim da esquina. Faça uma avaliação rápida, e configure-a logo, antes que alguém tenha a mesma intuição. Mas, comece por dimensionar , sobretudo, os prejuízos.  Lucros são uma decorrência da gestão e da oportunidade reprodutiva do investimento e do trabalho que só o capital sabe como fazê-lo.  Se tiver condições de suportar os prejuízos, invista no futuro imediato. O futuro longínquo a Deus pertence.
 
        Não fique parado esperando a volta dos empregos, o impeachment ou à permanência da presidente Dilma. Quando isso acontecer, com ela, com Temer ou seja lá com quem for, os investidores estarão longe. Pode faltar capital. A cada crise os investimentos migram e, em geral, para um outro mundo. E não é o mundo do futuro. Os bons investidores nunca aplicam no futuro. Os ganhos são imediatos e reais. Para os cidadãos comuns vai sobrar só trabalho, sacrifício e, lá no fundo, a sua fugaz criatividade. Não a deixe escapar. Apegue-se a ela.
 
*Jornalista, professor. Doutor em História Cultural

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