terça-feira, 13 de maio de 2014

Legado da Copa de Futebol:E se o Brasil perder?

 
Aylê-Salassié F. Quintão*
 
Houve  momentos em que se acreditava nos  “legados”  de modernidade que a Copa de Futebol, os Jogos Olímpicos e Paralímpicos deixariam  para países como o Brasil , Grécia,  África do Sul, Rússia, Argentina e  a própria China, ao induzir as  sociedades nacionais ou locais a um novo  estado da arte. Haveria um salto civilizatório com a natural generalização interna de expectativas por uma melhor qualidade de vida,  equipamentos urbanos mais adequados – ruas, passeios, energia, comunicações, transportes -  produtos, serviços e  empregos mais qualificados e até uma espécie de up grade nas relações e no comportamento humano.
 
Tendo vivenciado o ambiente de alguns jogos olímpicos e copas, começo a duvidar da extensão e das intenções que lastreiam esse tipo de organização supranacional, amparada, de um lado, na iniciativa privada e, de outro, nos cofres públicos, exceção seja feita aos jogos que aconteceram nos Estados Unidos(1984/1994). Os pré-requisitos para a eleição do país sede são tão sofisticados, que deixam margem a dúvidas se os dirigentes dessas organizações seriam politicamente ingênuos , oportunistas ou condutores convictos de  uma plataforma de alavancagem cultural do capital e do capitalismo ?  O imbróglio é de meter medo, segundo revela o britânico Andrew Jennings  em dois livros, “Senhor dos Anéis” e “Jogo Sujo”, e assusta qualquer sociedade.
 
Assim, evito imaginar que costumes, práticas,  estilo de vida e de governança enraizados no Brasil venham a ter expressão suficiente para impactar  diretamente a organização e o sucesso de eventos  dessa magnitude, política e supostamente neutros. O movimento “Não vai haver Copa” é uma realidade, mas a possibilidade  de que ele venha a impedir a realização dos Jogos   é quase impossível, na opinião dos especialistas em segurança pública. O governo vai mobilizar e deixar , no mínimo, de prontidão para qualquer eventualidade, polícias militares, civis, exército, as forças especiais, enfim um sistema de repressão de fazer inveja a um estado de guerra,  com respaldo total para agir “com firmeza”, ou seja “baixar o pau”, “prender e arrebentar”. Até mesmo a segurança privada, com um contingente de 600 mil homens no País, será mantida sob um outro regime de trabalho durante a Copa, visando proteger patrimônios.
 
Por essas razões é bem provável que governantes e políticos brasileiros  mais oportunistas já tenham desenvolvido seus planos “A”, para antes da Copa; plano “B”, durante;  e plano “C” ,  o que vem depois. Os sinais captados na cotidianidade da vida social do Brasil – inflação crescendo, transportes piorando, reinvestimentos caindo, programas de saúde capengando, corrupção e violência aumentando – levam a crer que se pode atravessar daqui até a Copa uma espécie de “corredor polonês”,  com tendência a desembocar mesmo numa  forte repressão durante a Copa. Não é novidade. Em todos os países sedes desses eventos, a vigilância sobre  comportamentos públicos  tem exigido muito do aparelho repressivo, que age com rudeza, a fim de, sem discussão, assegurar o seu êxito e impedir que o país tenha a imagem conspurcada mundialmente.
 
Há um grande receio ainda no Brasil de que, pela proximidade que se estabeleceu com a política,  a seleção brasileira venha a ser vaiada, e que isso possa refletir na própria performance dos jogadores. Aí está a chave para o Plano “C”, o que vem depois.  Se o antes e o durante assusta, imagina se o Brasil perder a Copa?  Não se deve esperar da campanha eleitoral menos violência, arrocho fiscal menor e nem tolerância maior. Será  um “salve-se quem puder”, semelhante ao que aconteceu na derrota brasileira na Alemanha, quando todos saíram pelos ralos. É difícil predizer o que se deve esperar na fase pós-Copa, sobretudo do mês de “agosto”, para explorar um pouco da nossa crendice popular. Com certeza, entretanto, só após a Copa  poder-se-á avaliar o tamanho do legado cultural e contabilizar o impacto nos cofres das instituições financeiras do Estado, inclusive nas contas do Tesouro Nacional.
*Jornalista, doutor em História Cultural, consultor da Catalytica Empreendimentos Sociais Inovadores  ( Tel :61-34682509)

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