Os funerais do presidente da Coréia do Norte, Kim-Jong-il, traduzem um responsório, se forem autênticas as imagens das lágrimas vertidas e das expressões de dor do povo pela perda do seu líder. Rituais de velório e sepultamento que deixariam perplexo Fustel de Coulanges, o mestre da análise do culto e da divinização dos mortos, em sua formidável obra “A Cidade Antiga” (1864).
Falo em autenticidade, porque a Coréia do Norte tem o regime comunista mais fechado do mundo, baseado numa suposta dinastia ditatorial, e as informações e imagens saem de Pyongyang sob censura do governo ou pelas vias alternativas de Seul e Pequim.
Transcorreram 12 dias- entre a morte e o sepultamento do ditador- de mistério, expectativa e apreensão mundiais sobre o rumo que aquela pequena potência nuclear tomará nas mãos do filho e provável sucessor, Kin-Jong-un, de 29 anos de idade, alçado à condição de comandante supremo das Forças Armadas.
O acontecimento em si comporta as mais variadas análises e especulações no Oriente e no Ocidente, mas o farto noticiário a respeito, tendente a se multiplicar por alguns meses, é alimentado pelo receio, por parte de grandes potências, de um desequilíbrio político-militar naquela região, com repercussões mundiais.
Não seria, obviamente, receio de que o novo e jovem governante passe a instilar seus ímpetos guerreiros, que esses ele não os tem ou foram escoimados pelos seus estudos na Suíça. O receio é do aparatik militar e partidário, repleto de espiões infiltrados no povo e que controla não apenas os governados, mas também os governantes. Eis o efeito sinérgico de uma ditadura militar de esquerda.
Stalin centralizava em torno de si a sua equipe, o mesmo acontecendo com Hitler e Mussolini, os três encarnando o estado totalitário, em forma piramidal. No caso coreano, a pirâmide é invertida: Simula-se uma dinastia ditatorial, uma encarnação do poder transmitido de pai para filho e neto, mas não é crível que a família seja a chave do poder.
Quando se menciona o “Presidente Eterno” Kim-Il-sung, pai de Kim-Jong-il, se presta homenagem ao fundador da Coréia do Norte, em 1948, mas os verdadeiros donos do país são as Forças Armadas, altamente profissionalizadas, com mais de um milhão de efetivos e um poderoso arsenal, controladoras do próprio sistema partidário (Partido dos Trabalhadores, amplamente hegemônico, Partido Chondoísta e Partido Social-Democrata, coligados.)
A alma das Forças Armadas é o Exército Revolucionário da Coréia do Norte, cujo espírito é o mártir e herói da libertação, Ahn-Jung-gun, executado pelos japoneses em 26 de março de 1910. É esse o espírito que rege o corpo e a alma da Coréia do Norte, e ele não fará nada que a China e a Rússia não permitam.
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