Essa decisão tomada pelo governo federal e seguida pelos governos estaduais, de só admitir no serviço público,em cargos comissionados,quem tiver Ficha Limpa ajudará a coibir a prática de corrupção, mas poderá abrir caminho para maior nepotismo nas contratações,em detrimento da meritocracia.
Tomando-se a condição de inelegível do candidato,por decisóes judiciais, como ponto de partida para avaliação do candidato ao cargo comissionado, fica estabelecida a premissa de que o candidato que tem ficha limpa será incorruptível no exercício do cargo de direção ou assessoramento, o que não passa de uma grande falácia.
Santo Agostinho diz que só é corruptível o que é bom, pois o ótimo (Deus) não se permite corromper, e o que é ruim já foi corrompido...Portanto, homens bons são potencialmente os homens corruptíveis, e corre-se o risco, com essa lei da ficha-limpa para contratações, de se passar um cheque em branco para todos os que vierem a ser contratados porque não tem antecedentes que os condenem...
O critério de contratações que exclua a meritocracia, ou seja, a seleção por concurso público e a ascensão funcional com base na competência para determinado exercício, merece reflexões mais profundas; há,de fato, necessidade de provimento de cargos de assessoramento e direção em muitos órgáos do serviço público, cuja natureza do serviço permite a livre nomeação, pois a dinâmica dos trabalhos em muitos casos não pode aguardar o processo moroso de realização de concurso.
Mas, há meios de selecionar,rapidamente, elementos para esses cargos de livre nomeação, mediante argüições ou testes de avaliação ágeis, mesmo que o candidato seja produto de nomeação política.A flexibilização das contratações,portanto, é um caminho alternativo para os dois extremos: Concurso público ou livre nomeação só com base na ficha limpa.
O concurso público apresenta a desvantagem de deixar muitos candidatos aprovados e com estabilidade garantida acomodados na carreira, enquanto a livre nomeação abre espaço para a excessiva politização do serviço público via apadrinhamento. Daí a necessidade de um meio-termo.
Não entendo porque a Ficha Limpa, lei que nasceu da iniciativa de dois milhóes de brasileiros, para os cargos eletivos, vem sendo estendida às contratações do serviço público.A atividade política é diferente do serviço público e está condicionada ao filtro partidário e ideológico e aos objetivos maiores, o voto e o poder. É um direito do cidadão exercê-la.
Serviço público,como deixa bem claro Hely Lopes Meirelles e tantos outros autores da administração pública, é um dever do estado, que se situa na esfera estatal,e não dos interesses privados, que são estreitamente imbricados à política.
Essa miscelânea moral,ética e política em que transformaram a Lei Ficha Limpa pode contaminar, de forma altamente danosa ao País, todos os governos estaduais e prefeituras, numa utópica e solerte tentativa de implantação de uma nomenklatura mestiça.
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