segunda-feira, 30 de julho de 2012

"Mensalão": Toga não é farda, e Brasil não é Pompéia


O início, na próxima quinta-feira, do julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, dos 38 acusados de envolvimento no “Mensalão” - um esquema ilegal de financiamento político que teria sido organizado, durante o Governo Lula (2003-2010), para a compra de apoio parlamentar no Congresso Nacional - é marcado por um clima artificial de apocalipse ético e moral da república brasileira.

Considero um clima “artificial” porque a mídia em geral tem dado sustentação ao caso como espécie de “Rubicão” da atual política brasileira, tentando posicionar cada um dos 11 juízes do processo no STF na mesma situação do general Romano Júlio César e criando um clima de expectativa quanto à estabilidade político-institucional do País.

Mas, a toga não é farda, e o Brasil não é Pompéia... Ainda que o ex-presidente Lula (que não é réu), o PT e demais partidos envolvidos no “Mensalão”, vários deles atualmente componentes da base aliada do Governo Dilma no Congresso Nacional, tenham receio do que esse julgamento possa representar para sua reputação e força, no jogo do poder, a corte que zela pela integridade da Constituição Federal, o STF, apenas vai tomar mais uma decisão com base no estrito cumprimento da Lei, impedindo sua violação, não cabendo nesta responsabilidade judicante nenhum viés de heroísmo.

Com tanta pressão sobre o STF, seria risível, senão trágico, que uma eventual imputação de culpa aos réus e, por extensão, ao Governo Lula, desencadeasse o dilúvio... Assim como, uma absolvição desacreditasse o primado da lei perante a Nação, comprometendo o funcionamento das instituições. Esse julgamento não tem  potencial para servir de “cheville  ouvrière” para qualquer golpe, mesmo porque as instituições militares estão atentas à sua missão constitucional...

Valho-me da definição de Francisco Bilac Moreira Pinto para corrupção: A corrupção constitui violação das normas éticas que devem orientar a conduta de quantos exerçam cargos ou funções públicas. Ela revela sempre, da parte do seu agente passivo - que é o político ou o servidor público - baixo nível de moralidade”. “As causas da Corrupção” – in Enriquecimento Ilícito no Exercício de Cargos Públicos. Rio de Janeiro: Forense, 1960. P.59-63)

O “Mensalão” envolveu 141 milhões de reais em dois anos, mas somente o destino de 32 milhões foi apurado pelo Ministério Público Federal. Onde se encontram os 109 milhões de reais restantes? É a pergunta que permanece, sete anos após a imprensa ter denunciado o esquema. O processo – Ação Penal 470 - já tem 50 mil páginas e mais de 600 testemunhas ouvidas.

Os ministros analisarão, perante os advogados dos réus, se eles cometeram sete crimes: Formação de quadrilha, corrupção ativa e passiva, peculato, evasão de divisas, lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta. Após a decisão e a publicação da sentença, os réus ainda poderão apresentar recursos.

Afinal, quem seria corruptor ou agente passivo? O empresário Marcos Valério, dono da DNA Propaganda? O banqueiro Daniel Dantas, dono do Banco Opportunity? O ex-ministro da Casa Civil de Lula e deputado José Dirceu, do PT, que proclama sua inocência? O tesoureiro do PT à época, Delúbio Soares? O julgamento revelará...

Os Estados Unidos (no Governo Truman, o famoso escândalo dos “five percenters”; no Governo Nixon, o caso “Watergate”; no Governo Bush, “escândalos corporativos”), a Itália(no Governo Berlusconi,escândalos sexuais, políticos e de corrupção); a França( financiamento ilegal de campanha, no governo Sarkozy),etc., entre outros países desenvolvidos, tiveram rumorosos processos de corrupção envolvendo presidentes e altas figuras do governo, e o desfecho desses escândalos não impediu que suas instituições mantivessem pleno funcionamento. Por que seria diferente no Brasil?

O “Mensalão” teria seu protótipo concebido em Minas Gerais, em 2007, quando o governador era Eduardo Azeredo, do PSDB. Azeredo, ex-senador e autor de propostas de controle da internet, foi considerado réu pelo STF por crimes de peculato (roubo de dinheiro público) e lavagem de dinheiro. É possível que esse modelo tenha se reproduzido hoje por todo o Brasil, e até outros países, de forma mais requintada.

Na esteira do “Mensalão” outros escândalos de corrupção política foram apurados, sendo um deles o “Mensalão do DEM”, em 2009, envolvendo políticos do partido Democratas e do PMDB, tendo como pivô o governador José Roberto Arruda, que chegou a ser preso e deposto, após a operação “Caixa de Pandora” realizada pela Polícia Federal. E, atualmente, os escândalos envolvendo os governadores de Goiás, Marconi Perillo, do PSDB, e do Distrito Federal, Agnelo Queiróz, do PT, com o contraventor “Carlinhos Cachoeira”, objetos de investigação de Comissão Parlamentar de Inquérito instalada no Congresso Nacional.

O desfecho do julgamento do “Mensalão é aguardado com expectativa porque tem potencial para respingar no ex-presidente Lula e no próprio Partido dos Trabalhadores, com repercussões nas próximas eleições municipais de outubro em todo o País, além, de desdobramentos internacionais, à medida em que houver nexos entre algum crime tipificado, votações parlamentares e atos do governo naquele período de operação do esquema.

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