Em sua fase de “dosemetria” das
penas a serem imputadas aos 25 réus condenados pelo Supremo Tribunal Federal,
no julgamento do “Mensalão”, entre os quais o ex-ministro José Dirceu, chefe do
Gabinete Civil do Presidente Lula, em 2005,quando eclodiu o escândalo da
corrupção no âmbito da base parlamentar do governo ,envolvendo a quantia de 350
milhões de reais para a compra de votos, há um suspense geral no Brasil em
torno da figura do empresário Marcos Valério, um dos condenados.
Já condenado a mais de 40 anos de
prisão, Marcos Valério, de cujo nome se extraiu a expressão “Valerioduto”,
referência aos ductos por onde transitaram as somas –algumas astronômicas- que
reforçaram as contas bancárias e os bolsos dos membros do grupo, é atualmente
um arquivo vivo importante do País, razão pela qual teme ser morto e quer a
delação premiada, como proteção física e artifício de redução da pena.
Enquanto o relator do processo, ministro
Joaquim Barbosa, aperta o cerco e exige a retenção dos passaportes dos condenados,
para evitar que fujam do Brasil e até mesmo para desbastar ranços de impunidade
e escárnio de algumas figuras perante a opinião pública, em detrimento da
imagem do STF, os observadores mais atentos do cenário político observam os
movimentos de Marcos Valério, com uma pergunta que não quer calar: “O
Presidente Lula sabia de todo o esquema?”.
Valério, em entrevista à revista “Veja”,
afirma que Lula sabia. Outra coisa é ele afirmar isto perante o STF. O PPS e o
PSDB, partidos de oposição, encaminharam à Procuradoria Geral da República pedido
de investigação sobre a participação do Presidente Lula, com base na teoria do
domínio do fato,segundo a qual, se o ministro Dirceu estava envolvido, seu
chefe e beneficiário final do esquema também sabia e consentia.
Há um porém nessa iniciativa da
Oposição, que pode incendiar o País, se confirmada a participação do Presidente
Lula: A Presidente Dilma Rousseff, que exercia, em 2003, o cargo de ministra
das Minas e Energia e tinha acesso confidencial ao Presidente Lula, poderia ser
chamuscada pela teoria do domínio do fato.
Em 2009, Dilma prestou depoimento
judicial sobre o assunto, observando que as medidas provisórias criando marcos
regulatórios para o setor da energia foram aprovadas com surpreendente rapidez
no Congresso, ela (Dilma) explicando que a surpresa positiva foi parlamentares
até da oposição compreenderem que o setor estava â mercê de outros “apagões” no
sistema elétrico.
O efeito cascata da teoria do
domínio de fato, aplicado ao caso do “Mensalão”, passaria a ter efeito
avassalador, contaminando figuras, atos governamentais e, possivelmente, atores
políticos atuais ainda ocultos aos olhos da opinião pública pelo jogo de luzes
e sombras do procênio
Nesse quadro, vejo os seguintes
cenários possíveis sobre o “Mensalão”:
1. A
Procuradoria Geral da República indefere o pedido do PPS, Dirceu assume tudo e
Marcos Valério se cala aceitando resignadamente as cominações legais, tudo em
nome da estabilidade político-institucional;
2. A
Procuradoria Geral da República defere o pedido do PPS e parte para as
investigações; Lula fora de suspeição, o sistema político digere o “Mensalão”;
Lula suspeito e réu, alguns assessores e ministros de Lula, entre os quais
Dilma, excluídos do processo atual, ficam sujeitos às investigações. Nesse caso,
a teoria pode ser outra, a do dominó...
Em suma, há
duas pessoas, numa cristalina bipolarização de tudo, sobre as quais repousa a
atual estabilidade política do Brasil: A Procuradoria Geral da República e o
Presidente Lula.
Num raciocínio
filosófico, estaria a nação brasileira diante do dilema cunhado por Stanislaw
Ponte Preta, pseudônimo do cronista carioca Sérgio Porto, na década dos 60, em
seu Febeapá - Festival de Besteiras que Assola o País -: ”Restaure-se a moralidade, ou nos locupletemos todos.”?
Não
creio.Penso que a cultura política brasileira trará resposta a esse dilema,
pois há uma Razão autônoma, no próprio regime democrático, capaz de fixar os
limites morais e éticos da forma de governo republicana escolhida pela sociedade
brasileira, orientando o processo de decisão política em consonância com as
transformações estruturais e conjunturais nacionais e internacionais.
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