Adriano Benayon *
1. O percentual no PIB dos investimentos na produção e na infra-estrutura física e social está em patamar muito baixo na comparação com os países em que a indústria é basicamente nacional. Isso ocorre desde os anos 70, quando já se deveria ter entendido que o modelo dependente é incompatível com o desenvolvimento.
2. Embora o crescimento natural da
população tenha sido contido, devido à intervenção de fundações
norte-americanas, a produção é de longe insuficiente para assegurar sequer
tolerável qualidade de vida à esmagadora maioria dos brasileiros. Ademais, a
produção e a infra-estrutura são orientadas em função de interesses
estrangeiros.
3. O modelo dependente gerou enorme
endividamento, cujo serviço asfixia a economia brasileira. De há muito, a taxa
de investimento do Brasil corresponde a cerca de metade das da China, Coreia,
Taiwan e outros.
4. Houve um processo cumulativo de
desnacionalização e de concentração econômica, determinantes de crescente
ascendência das transnacionais sobre o “poder público”, criando instituições e
mentalidade que levam a brutal desperdício dos recursos investidos.
5. Por isso não só se investe pouco, mas se investe mal, em todos
os sentidos: na escolha de em que investir e no modo de realizar os
investimentos.
6. Enquanto o Titanic afunda,
economistas prosseguem fazendo propostas tópicas, sem perceber – ou fingindo
não perceber – que nenhuma delas resolve coisa alguma enquanto perdurar o
modelo dependente.
7. Lembrando que, desde 1990, a renda per capita cresce a 1,7% ao ano (4% entre 1930 e
1980) e que a taxa de investimentos patina em torno de míseros 18% do PIB, Bresser Pereira propõe, como solução salvadora,
reduzir substancialmente os juros e desvalorizar a taxa câmbio do real.
8. Essas medidas seriam em si
benéficas. De fato, seis pontos percentuais na redução dos juros públicos,
incidindo sobre a dívida interna de 3 trilhões de reais, liberariam recursos
para investimentos de infra-estrutura e produtivos de R$ 180 bilhões anuais (4%
do PIB).
9. Vantagem adicional decorreria da baixa dos juros pagos pelas empresas
produtivas e por pessoas físicas, diminuindo custos e elevando renda. Ademais,
é infundada a ideia, amplamente disseminada, de que juros altos detêm a
inflação.
10. A queda dos juros induziria, ainda, a desvalorização cambial, já
que, eliminado o grande diferencial entre as taxas reais de juros internas e as
taxas deprimidas dos EUA, Europa etc., cessaria o grande afluxo financeiro que
vem “equilibrando” o balanço de pagamentos (BP).
11. Entretanto, sem essa entrada de capitais, sem grandes investimentos
diretos estrangeiros e aquisições de empresas nacionais, o elevado déficit de
transações correntes se traduziria em déficit no BP. Desencadear-se-ia fuga de
capitais estrangeiros (dos quais uma parte é de brasileiros com depósitos no
exterior).
12. Isso faria o real desvalorizar-se muito além do desejável e acelerar
a inflação, pois o País está mais dependente, que no passado, de importações de
bens de capital, insumos e bens finais.
13. É evidente, pois, que não seria viável reduzir significativamente os
juros, sem instituir rigoroso controle de capitais e sem racionar de divisas,
diferenciando importações essenciais das demais, seja com taxas múltiplas de
câmbio, seja com elevados impostos para as importações menos essenciais e para
as supérfluas.
14. Óbvio também que tudo isso só é viável se o governo tiver
autoridade, poder e vontade de afrontar as regras da comunidade financeira
(oligarquia da ordem mundial anglo-americana) instrumentadas através de seus
cães de guarda, FMI, Banco Mundial e Organização Mundial do Comércio (OMC).
15. Além de ter autonomia em face dessas instâncias “internacionais”,
teria o governo de, ou exercer efetivo controle sobre bancos e empresas
oligopolistas, ou estatizá-los, já que, do contrário, represálias de uns e das
outras levariam à desestabilizaçáo do governo, como de hábito, dirigida por
serviços secretos das potências imperiais.
16. Precisaria, ainda, elevar, inclusive qualitativamente, a produção e
manter a inflação sob controle, e isso só seria possível retirando dos
oligopólios, na maioria de transnacionais, o domínio, sem concorrência, sobre
os mercados e acabando com os abusos dos detentores dos serviços públicos
privatizados e dados em concessões.
17. Ora, o que o atual Executivo federal está fazendo é o contrário de
tudo isso, apoiado pelo Congresso, sempre entreguista. Não só mantêm-se as
privatizações e as concessões, que já haviam deteriorado a qualidade e
encarecido os preços da eletricidade e das telecomunicações, como se ampliam os
privilégios dos grupos que os exploram. Além disso, o Estado prossegue fugindo
a seus deveres, ao entregar novas áreas, como aeroportos, portos e ferrovias.
18. O modelo é outorgar a exploração dos serviços, oferecendo dinheiro
público e financiamento, a juros mínimos, por bancos estatais, e garantir lucro
elevado e sem risco aos beneficiários.
19. Em requinte privatista, regado a dinheiro dos contribuintes, o
governo planeja que o Tesouro e o BNDES repassem recursos aos bancos privados
para emprestarem aos concessionários dos novos serviços privatizados.
20. Ou seja: mais negócios para os bancos lucrarem com dinheiro que não
lhes pertence, acrescendo aos colossais fundos que já lhes são providos pelos
depositantes (em dezembro, o governo reduziu em mais R$ 15 bilhões, os
depósitos compulsórios dos bancos no Banco Central).
21. Lucro sem comparação em todo o mundo para grupos privados - garantido
e sem risco - tudo bancado pelo Estado – é como o governo pretende promover o
crescimento dos investimentos em infra-estrutura.
22. “Pretendem” diminuir o famigerado
“custo Brasil”,melhorando a competitividade da economia. Mas não atentam para:
a) custos artificialmente elevados
pela contabilidade dos oligopólios;
b) o kafkiano e abstruso método usado
para que as distribuidoras (privatizadas) da energia fiquem com o grosso dos
ganhos decorrentes de preços altíssimos, sem nada terem investido na geração e
na transmissão;
c) as restrições impostas por IBAMA,
FUNAI, organizações estrangeiras e ONGs, e ministérios públicos federal e
estaduais, a que hidrelétricas sejam construídas com integral aproveitamento do
potencial hídrico;
d) a supressão das eclusas, cuja
falta deixa de criar vias fluviais navegáveis, num País em que a
infra-estrutura de transportes não poderia ser mais horrorosa;
e) a falta de adequados procedimentos
de controle dos custos das obras e de concorrência que viabilize a participação
de empresas de capital nacional de menor porte.
23. Por fim, não se consegue tornar o
Brasil competitivo aplicando vultosos recursos em pesquisa científica e
tecnológica (previstos R$ 32,9 bilhões em 2013/2014), apregoando grande salto
na inovação, porque esse dinheiro é dissipado enquanto não houver condições
para que empreendimentos de capital nacional vinguem no mercado.
* - Adriano Benayon é doutor em economia e autor do
livro Globalização versus Desenvolvimento
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