quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Revisão Constitucional

Gélio Fregapani (Membro da Academia Brasileira de Defesa)

Terminadas as eleições. O povo escolheu, por pequena margem, grupo que lhe pareceu melhor, ou menos ruim. A escolha foi, em grande parte, por rejeição, entre a rejeição ao grupo pretensamente entreguista e a rejeição ao grupo com fama de mais corrupto. Os que rejeitam a ambos ou não votaram ou anularam seus votos.

A eleição está terminada e já é passado. Cabe a todos nós criarmos o futuro, primeiro promovendo a união, que faz a força. Ainda que nos pareça uma situação análoga a 1930 com acusações de fraude, nossa prioridade deve ser o marcharmos ombro a ombro, recomendou o grande Caxias. Caso grande número se concentre em suas divergências, todos sairão perdendo. Concentremo-nos, portanto, em algo que possa ser de interesse comum.

Todos os candidatos falaram em mudanças. Falaram em mudanças políticas, mas somente em reeleições e em financiamento de campanhas, assunto que só interessa aos políticos profissionais. Por que não falar em mudanças políticas que realmente interessem?

Este ensaio propõe, em três artigos, uma organização lógica, econômica e eficiente para a nossa Nação-Estado, na esperança que seja discutida em uma próxima revisão constitucional. A organização proposta certamente contrariará interesses pessoais de políticos, mas se adotada será nitidamente melhor que a organização atual. Caso mereça a adesão do povo, até os maus políticos podem ser forçados a concordar com algumas das medidas. Se não, poderá inspirar a alguém alguma idéia nova, que pode ser a melhor solução.

REVISÃO CONSTITUCIONAL (I)

Em primeiro lugar devemos rearticular o Legislativo; como está não funciona e é caro demais.  Nós temos um Senado, que representa os estados e uma Câmara, representando a população.

Vejamos primeiro o Senado:

O Senado destina-se a representar os Estados como organizações políticas, entretanto, como os senadores são escolhidos em eleições diretas, com freqüência estão em oposição ao governo de seu estado. Em conseqüência os senadores não representam os seus Estados, mas sim o grupo que o elegeu, tal como qualquer deputado. No momento são três senadores por Estado e quando são de partidos diferentes e divergem nas opiniões, fica difícil saber exatamente o que o Estado deseja ou reivindica. O ideal seria que fosse um só senador por Estado e este fosse escolhido pelo respectivo governador e aprovado pela respectiva Assembléia Legislativa. Estariam ambos afinados, já que o governador poderia substituí-lo e o voto dele representaria realmente a opinião do Estado.

As vantagens econômicas são significativas, considerando os dois terços a menos de senadores, assessores e demais séquitos, mas o realmente importante refere-se a real representação do Estado, não conseguida na atual forma. Complementando a proposta, sugerimos que os senadores tenham que ser escolhidos pelo Governador, mas, obrigatoriamente, entre os deputados estaduais. Estes, supõem-se, serão um fator de estabilidade e pensarão mais no Brasil como um todo do que outro muito envolvido com as questões de seu Estado.

Vejamos agora a Câmara:

A Câmara destina-se a representar o povo, ou seja, os vários segmentos da sociedade. A eleição direta é indispensável, mas poderia ser adotado idealmente o voto distrital misto. O problema da Câmara é o número excessivo de deputados.  Sociologicamente nada funciona em, de dois terços, com um mínimo de três por Estado.

Um problema a ser resolvido é o do quorum. É óbvio que os políticos têm que manter contato com seus estados e suas bases eleitorais e para isto precisam se afastar da Capital. Uma das soluções possíveis é o funcionamento alternado da Câmara e do Senado, um deles em cada semana, entretanto, é certo que isto só funcionará havendo punição rigorosa para as faltas, tipo multa de meio salário por dia.

Nós todos sabemos que a parte mais fraca da nossa democracia é o Congresso. É onde estão as maiores mordomias e as maiores corrupções, mas não existe democracia sem ele. Sabemos também que pode ser aperfeiçoado e temos que aperfeiçoá-lo com urgência pois, além de ineficiente, está caro demais. A primeira medida é diminuir o número dos deputados e dos senadores; só isto já diminuirá os custos e facilitará as decisões.

Podemos pressupor também que diminuindo o número de deputados, apenas os melhores serão eleitos. Quanto aos senadores, a indicação fará com que eles realmente representem seus Estados, poupando as custosas representações que atualmente fazem este papel.  A economia da redução proposta, entendida às Câmaras Legislativas Estaduais e aos órgãos legislativos municipais é difícil de calcular, mas é fácil de imaginar os benefícios para o País.

No próximo ítem, trataremos do Executivo, particularizando a organização dos Ministérios e em menor escala, do Judiciário.

REVISÃO CONSTITUCIONAL (II)

Este ensaio trata de uma melhor organização para o Poder Executivo, isto é: Presidência , Ministérios e órgãos afins, e faz um ligeiro comentário sobre o poder judiciário.

Na Presidência em si nada há que mudar, apenas deve ter ligado diretamente a si, além dos Ministérios, duas "Secretarias Nacionais" e um Conselho de Estado.  As Secretarias seriam a Nacional de Inteligência (SNI) e a Nacional de Comunicação Social (SNC). O Conselho de Estado faz o papel de uma "Secretaria de Assuntos Estratégicos", o que não deve ser confundido com "Inteligência".

A Vice-Presidência é um problema que precisa ser corrigido. O Vice necessita ter uma função, além de esperar pelo impedimento do Presidente. Creio que o Vice deve ser o Ministro da Economia ou o titular de outro Ministério que seja, no momento, mais importante.  Deve ser designado pelo Presidente e aprovado pelo Congresso.  Penso também que obrigatoriamente deva ser um congressista, para ter pelo menos um mínimo de ligação com o Legislativo.

O atual número de Ministérios é excessivo e faz com que o Presidente tenha que tomar conhecimento de detalhes de baixo nível e decidir sobre eles.  O ideal parece ser apenas cinco, cada um com tantas diretorias quanto necessárias. Estes cinco poderiam ser:

- MINISTÉRIO DA ECONOMIA, com as Secretarias da Fazenda, de Planejamento e da Receita;

- MINISTÉRIO DO INTERIOR, com as Secretarias de Indústria e Comércio, de Minas e Energia, de Agricultura, de Comunicações,  de Transporte e de Ciência e Tecnologia.

- MINISTÉRIO DOS RECURSOS HUMANOS, com as Secretarias do Trabalho, de Ação Social, de Saúde, de Educação, da Ciência e Tecnologia, da Previdência e da Justiça.

- MINISTÉRIO DE RELAÇÕES EXTERIORES, com as Secretarias das Américas, Europa, Ásia e África.

- MINISTÉRIO DA SEGURANÇA, com as Secretarias dos Comandos Militares Conjuntos do Sul, Norte, Leste, Centro Oeste, do Comando Naval do Atlântico, do Comando Aéreo Estratégico e da Secretaria da Polícia Federal.

As Secretarias citadas aqui como exemplo são apenas para opinar sobre a área de abrangência. Cada Ministério deverá constituir-se segundo as necessidades após a definição das respectivas áreas.

Quanto ao Poder Judiciário, a reformulação necessita ser completa. Atualmente todos os que podem evitam a Justiça em razão, principalmente, da lentidão de seus procedimentos. A solução que vislumbramos é um juizado de pequenas causas em cada delegacia, de modo que os casos compatíveis possam ser resolvidos na hora. Assim a maioria dos problemas deixará de existir.

Nas demais instâncias , persiste a necessidade de diminuir a atual lentidão. A solução pode ser "um prazo máximo", mas é indispensável a existência de um órgão que possa julgar não só os erros dos juízes como também a ultrapassagem dos prazos.

REVISÃO CONSTITUCIONAL (III)

Esta parte final visa propor uma melhor prática da Federação, como  forma de evitar a eclosão de movimentos separatistas e de permitir que cada brasileiro escolha, dentre os Estados, qual o que prefere viver não só pelo clima e oportunidades mas também pela legislação que lhe agrade.  Assim, é necessário que a autonomia das unidades da Federação seja ampliada em vários sentidos.

As diversidades do meio físico, do clima e do estágio de desenvolvimento fazem que as leis, adequadas para um Estado, possam ser totalmente inconvenientes em outro. No momento temos uma legislação trabalhista que pode ser ótima para S. Paulo e inibidora do desenvolvimento no Piauí, outra, relativa ao meio ambiente, possa ser adequada para o Rio Grande do Sul, prejudicial na Bahia e odiada no Amazonas, onde até as autoridades a ela se opõem frontalmente, além de outros tantos aspectos fiscais, judiciários e que regulam a vida comum e que deveriam ser adaptadas as circunstâncias locais.

O importante é a Constituição, determinar apenas organização básica da Federação, as (poucas) imposições federais, o âmbito de atuação e os tributos federais. O resto todo seja de responsabilidade de cada Estado

Desta forma, caberá exclusivamente à União:

I - Estabelecer relações com estados estrangeiros

II - Participar de organizações internacionais

III - Declarar guerra e fazer a paz

IV - Emitir moeda e decidir sobre os impostos Federais

V - Comandar as Forças Armadas

VI - Decidir sobre as vias de transporte interestaduais e internacionais em nosso território

As demais atribuições deixam, em princípio, de ser competência exclusiva da União Federal, que assumirá mais um papel de coordenação geral. Desta maneira, os Estados se organizarão conforme as preferências de seus habitantes; os que quiserem priorizar o desenvolvimento assim o farão, os que preferirem o meio ambiente que o façam, os que desejarem armar os homens de bem o problema é deles, os que priorizarem a proteção aos bandidos adolescentes que arquem com as consequências.  Ë bom lembrar que isto começa a acontecer independente das leis, e quando as tentativas de repressão se chocam com uma forte aspiração local, as consequências são imprevisíveis.

Poderiam existir argumentos contra; por ex. haveriam estados dominados por oligarquias, mas se são é porque querem ou ao menos consentem. Que direito teriam os outros Estados de impor o fim de uma oligarquia nas Alagoas caso eles lá assim o desejem?  Ou de entregar a metade de Roraima para um pequeno punhado de índios contra a vontade de toda a população local?

Há, entretanto, duas condições básicas para o bom funcionamento da União Federal: Não haver barreiras fiscais entre Estados e que cada Estado possa arcar com suas despesas. Desta maneira certamente teremos um Brasil mais próspero e mais feliz.

As medidas propostas são, naturalmente, incompletas. Só devem servir para levantar ideias, mas caracterizam muitas das aspirações de nossa gente, a qual deseja mais autonomia e menos burocracia, mais respeito às tradições locais e menos imposições de quem não tem nada com isso. 

Que Deus ilumine as decisões do novo (velho) Governo!

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