2. Entretanto, esses avanços - interrompidos de 1946 a 1950, quando a política do País se submeteu facilmente ao
império angloamericano e à polarização ideológica da Guerra Fria – não foram
suficientemente retomados e atualizados,
sequer com a volta de Getúlio Vargas à presidência da República em 1950,
pelo voto direto do povo.
4.Essa intervenção logrou derrubar o presidente e inaugurou uma era, que
completou 61 anos, de sucessivas renúncias à autonomia econômica e política do
Brasil.
5.A desnacionalização da indústria, política oficial desde janeiro de 1955,
conduziu à desindustrialização e causou déficits externos, originadores da
dívida externa e depois da dívida pública interna.
6.A política de destruição da Nação foi grandemente radicalizada por meio das
três primeiras eleições diretas, sob a Constituição de 1988, regime de aparente
democracia: a de Collor em 1989 e as duas de FHC, 1994 e 1998, que desencadearam verdadeiros
tsunamis de entreguismo e institucionalizaram a devastação socioeconômica do
País.
7.A corrupção, em todas suas acepções, já havia formado maioria folgada dos
constituintes, para inserir na Lei Básica normas estratégicas contrárias aos
interesses nacionais.
8.Os analistas viciados no engano de qualificar tudo sob o prisma ideológico
esquerda/direita, definiram como “Centrão” os constituintes “centro-direita”
favoráveis a essas normas, que poucos da “esquerda” combateram.
9.Nem um só parlamentar denunciou a aprovação do art. 164, nem a inserção no
texto constitucional, por meio de fraude, de cláusula no inciso II, parágrafo
3º do art. 166, que elimina limites à aprovação de verbas para o serviço da
dívida. O art. 164 põe o Tesouro Nacional à mercê dos bancos.
10.
O peso do dinheiro concentrado e da mídia antibrasileira nas eleições continuou
a eleger Congressos cada vez mais alheios aos interesses do País, a ponto de
terem aprovado dezenas de emendas à Constituição, favoráveis aos concentradores
financeiros estrangeiros e locais.
11.Ora, o processo de degradação econômica, política e cultural teve início nos
anos 50, quando o Brasil não havia construído
infraestruturas econômica e social de país desenvolvido.
12.Pior: a maioria das que se implantaram,
após 1955, foi planejada em favor dos carteis transnacionais aqui instalados
para obter lucros ilimitados da extração dos abundantes recursos naturais e do
controle do mercado consumidor.
13. A de transportes já era deficiente e não foi
corrigida, ficando ainda mais lastimável, considerado o crescimento econômico, ainda expressivo até o final dos
anos 70, graças a estes fatores:
inércia da industrialização anterior;
crescimento demográfico; os fabulosos recursos naturais do País; haver,
até então, recursos de monta para investimentos públicos, pois as finanças do
Estado ainda estavam em processo de serem arruinadas pelo modelo dependente,
causador das exações referentes ao serviço da dívida.
14.Como lembrou o professor de tecnologia Weber Figueiredo, o presidente Vargas, em 1950, dada a
insuficiência de trens em face da demanda de passageiros, mandara ampliar o
sistema ferroviário. Havia 676 trens e transportavam-se mais de 500 mil
passageiros/dia. Hoje são 450 mil e
pouco mais de 100 trens, muitos daquela longínqua época. Numerosas conexões no
interior foram suprimidas em São Paulo e
outros Estados.
15.Os transportes no Brasil retratam a situação de um país ao qual foi negada
permissão para desenvolver-se. Tudo serve aos carteis transnacionais do
petróleo/indústria automotiva. Predominam as rodovias. Não há linhas de metrô
que atendam minimamente a demanda das
regiões metropolitanas. As principais ferrovias são de natureza colonial: transportam aos portos colossais quantidades
de minérios: Belo Horizonte/Vitória; Carajás/Itaqui.
16.Onde houve desenvolvimento, houve uso
intenso das aquavias, como os cinco grandes lagos que ligam, nos EUA, Meio Oeste, Costa Leste e Canadá.
Inglaterra, França, Alemanha construíram densas malhas de rios navegáveis e
canais. Em 1900, já tinham boas ferrovias e ainda as estendem e aperfeiçoam. A
China constrói ótimas ferrovias e trens de alta velocidade em todo seu extenso
e acidentado território.
17.As ferrovias para transportar matérias-primas minerais e agrárias remetem ao
modelo econômico que não valoriza os recursos naturais do País nem os processa
em indústrias de capital nacional, porque acabou com elas, ao entregar o
mercado às transnacionais.
18.Esse modelo causa mega-catástrofes irreparáveis, como a do rompimento das
barragens de dejetos das minas, em Mariana, MG, operadas pela Samarco,
controlada pela transnacional anglo-australiana Billiton, com participação da
Vale.
19.Dada a corrupção e a obtusa mentalidade entreguista, nenhum dos poderes - a
nível federal, estadual e local - exige reais controles de segurança, nem se
mostra inclinado a acabar com os intoleráveis abusos. Chegam ao ridículo de participar de
entrevistas midiáticas junto com executivos da transnacional transgressora.
20.O desastre econômico e ambiental remete, por sua vez, à privatização da
portentosa Vale Rio Doce, em 1997, no esquema que entregou patrimônio de
dezenas de trilhões de dólares, por 3 bilhões, “pagos” com títulos podres e
compensados por créditos fiscais e outras benesses.
21.Da Serra de Carajás transportam-se diariamente 576 mil toneladas do melhor
minério de ferro do mundo, com o que ela tende a acabar em 80 anos.
22.O saqueio mineral é subsidiado pela isenção tributária na exportação (Lei
Kandir, LC 87, 13.09.1996, aplicável também ao agronegócio) e premiado por
taxação ínfima na extração.
23.
CFEM (Compensação Financeira pela Extração Mineral) - calculada sobre o líquido (a ETN arranja e
superfatura despesas minimizar o faturamento
bruto) - cobra estas
alíquotas: alumínio, manganês, sal-gema
e potássio: 3%; ferro, fertilizantes e carvão: 2%; ouro: 1%; pedras
preciosas, carbonados e metais nobres:
0,2%.
24.Foram extraídas, em 2013, das “nossas” minas de ferro 370 milhões de toneladas,
90% para exportação e 10% para o mercado
interno. Com a acelerada desindustrialização, a dependência do exterior
continua crescendo, e, mesmo com preços em queda, os minérios metalúrgicos respondem por 13% do
valor total das exportações.
25.Na agricultura o quadro é semelhante:
55% das terras são usados para cultivar
soja - metade da qual se destina à exportação - causando pauperização dos solos
– e contaminação de aquíferos -
decorrente do intenso uso de fertilizantes químicos, sementes
transgênicas e pesticidas altamente tóxicos.
26.As exportações agrárias somaram, em 2014,
US$ 96,7 bilhões = 43% das exportações totais do País, de US$ 225,1 bilhões, que equivalem a míseros
10% das exportações da China!
27.O caos agrário liga-se à miséria da energia, via setor sucroalcooleiro, formado
por enormes usinas e plantations, a maioria já desnacionalizada, a exportar
açúcar e álcool (6,1% das exportações totais), segundo o interesse dos patrões
transnacionais.
28.Esse esquema prevalece contra a correta ideia original do programa do álcool
(1974), que incluía agricultura familiar, descentralização, culturas
alimentares combinadas e aproveitamento de óleos vegetais - como dendê,
macaúba, pinhão manso etc. - para
substituir o diesel do petróleo, além do erguimento da química do álcool e dos
óleos vegetais.
29.Além de se fazer tudo errado no biodiesel, engodo para ocultar a mão pesada das
transnacionais - governantes das poluidoras fontes fósseis - as “alternativas” preferidas têm sido as
dependentes de tecnologia e equipamentos importados, como a eólica.
30.Ainda sobre a infraestrutura de energia, não é de omitir a devastação em curso,
desde Collor e FHC, a qual desnacionalizou o grosso da geração e distribuição
da hidroeletricidade, e instituiu um sistema de precificação, impossível de
entender, para propiciar indecentes lucros aos beneficiários, que já elevou as
tarifas, em 150% acima da inflação. No
processo, sugaram-se as estatais, a ponto de pôr a Eletrobrás em situação
falimentar.
* -Adriano Benayon
é doutor em economia pela Universidade de Hamburgo, Alemanha e autor do livro
Globalização versus Desenvolvimento.
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