sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Política caminha para o Parlamentarismo

O mandato da Presidenta Dilma Rousseff pode ser comparado a uma embarcação em alto-mar com diversas avarias e ameaçando adernar a boreste e a bombordo, em águas infestadas de tubarões famintos.
O rombo maior já foi provocado pelo presidente da Câmara dos Deputados, deputado Eduardo Cunha, quando aceitou, na última quarta-feira, o pedido para abertura do processo de impeachment contra Dilma formulado pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal.
Contribuiu para esse fato a prisão do senador Delcídio Amaral, que rompeu o equilíbrio instável do presidencialismo de coalizão, criando clima procelário em Brasília e minando qualquer possível entendimento entre Dilma e Cunha para  abafar os processos que os afligem.
Esse pedido de impeachment, o 28º de um total de 34 apresentados à Câmara dos Deputados pela Oposição, é baseado em descumprimento da Constituição pelo Governo Dilma, incorrendo em crime de responsabilidade pela prática das denominadas “pedaladas fiscais”, que são manobras contábeis e orçamentárias para gastos além dos limites legais em 2014 e 2015.
Uma guerra entre a Presidente Dilma Rousseff e o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, terceiro na linha sucessória e suspeito da prática de atos de corrupção que o tornam alvo de avaliação da Comissão de Ética da Câmara, é o clima dominante em Brasília,
A Oposição não quer convocação extraordinária do Congresso Nacional, que se encontra às vésperas do recesso parlamentar, enquanto o Palácio do Planalto, que deseja uma tramitação rápida do processo de impeachment, antes que haja mobilização nacional dos oposicionistas, tenta forçar a prorrogação dos trabalhos parlamentares.
É um jogo de braço que não mostra até agora nenhum vencedor, mas que pode ser crucial para o desfecho da crise política que se alastra no Brasil e contamina a economia – a pior crise vivida pelo maior país da América Latina, desde a Revolução de 1930, conforme bem sintetizou em recente matéria o jornal  “Financial Times”, de Londres.
Com a economia brasileira encolhendo cerca de 3% em 2015 e 2% em 2016, taxa atual de inflação estimada em quase 10% e déficit orçamentário de 30,5 bilhões de reais para o próximo ano, o anúncio da autorização de abertura do processo de impeachment de Dilma fez baixar a cotação do dólar e subir a bolsa de valores, numa reação do mercado sintomática e favorável à mudança de governo.
A leitura do documento  que justifica o  pedido de impeachment, feita pelo primeiro-secretário da Câmara dos Deputados, deputado Beto Mansur, do Partido Republicano Brasileiro –PRB- pelo Estado de São Paulo, demorou mais de duas horas.
Trata-se de longo e apurado texto relatando todas as manobras efetuadas pelo Poder Executivo durante o Governo Dilma (repetindo artimanhas dos seus antecessores Luiz Inácio Lula da Silva e Fernando Henrique Cardoso) para dominar o processo legislativo a seu interesse, sem levar em consideração o princípio da tripartição de poderes.
O principal instrumento que vem sendo utilizado pelo Poder Executivo, para manter sua hegemonia, desde a promulgação da Constituição de 1988, é a medida provisória, na qual são inseridos, costumeiramente, dispositivos estranhos ao teor principal (caput) da matéria, criando normas que legalizam, justificam e até legitimam decisões presidenciais que escapam à fiscalização dos demais poderes. Há mais de 70 mil normas no Brasil e a consolidação das mesmas se torna matéria desafiadora e complexa por causa das edições de medidas provisórias.
O documento extenso é um perfeito roteiro das artimanhas empregadas pelo Poder Executivo no Brasil para burlar a vigilância dos Poderes Legislativo e Judiciário e da própria sociedade na produção de leis para garantia da governabilidade. Expõe as entranhas do Presidencialismo brasileiro e as suas táticas de sobrevivência, razão pela qual, além de servir de estudo para países de todos os continentes interessados num modelo de estado normativo altamente cartorial e burocrático, abre caminho para um novo sistema de governo: O Parlamentarismo.
Sim, com o desnudamento do Poder Executivo, numa verdadeira radiografia das suas mutretas e do seu furor legiferante, em detrimento do Poder Legislativo, esse documento de múltipla autoria abre caminho para implantação do Parlamentarismo, ainda que como solução temporária e terapêutica para a crise atual.

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