segunda-feira, 15 de abril de 2013

Maduro atravessou o "Rubicão"


Francisco das Chagas Leite Filho

Quem viu a capa desta semana da revista Veja pôde pressentir o nível de achincalhe  e desestabilização que estão preparando para o governo Dilma na sucessão de 2014 : “Inflação. Dilma pisou no tomate”.

Além de uma atitude desrespeitosa para com a chefa de Estado, a manchete constitui uma distorção grosseira dos fatos, ao aludir à hipótese de um descontrole inflacionário, tomando como base a alta sazonal e isolada de um único produto. A revista Época, que segue na mesma toada da desmoralização, foi igualmente manipuladora, ao estampar: “A ameaça da INFLAÇÅO – Por que o governo pisou no tomate”.

O mesmo esquema desinforrmativo foi usado na Venezuela para virar o resultado eleitoral deste domingo, quando tentou, não apenas com manchetes mas com ações de sabotagem, como a explosão de redes elétricas provocando apagões em regiões vitais do país, e a retenção de criminosa de mercadorias para provocar o desabastecimento.

Mas os chavistas liderados pelo ex-chanceler Nicolás Maduro, o homem escolhido pelo falecido presidente Hugo Chávez para sucedê-lo no comando do país, conseguiram vencer a eleição com maioria absoluta, ainda que uma margem pequena de apenas 1,59%  (50,07% contra 49,66) ou 234 mil votos, num total de 18 milhões de eleitores.

Evidentemente que a diferença reduzida se prestou a mais explorações negativas e apocalípticas como as do tipo “reina a incerteza”, “Venezuela à beira do caos”, “fim de ciclo político”, ou “o país está dividido”, como se a diferença de George Bush de menos de um por cento sobre Al Gore, em  2000, o tivesse impedido não só de governar pelos quatro anos para que fora eleito, como também conseguisse outra reeleição, em 2004. Nenhuma destas vozes desestabilizadoras, entretanto, conseguiu  pôr em dúvida o  processo eleitoral venezuelano, considerado dos mais modernos e honestos.

Por esta razão, o eleito foi logo reconhecido e saudado pela comunidade internacional, a começar da Unasul (União das Nações Sul-Americanas), e dos presidentes da Rússia, Vladimir Putin, da Argentina, Cristina Kirchner, Evo Morales, da Bolívia, Rafael Correa, do Equador, e Raul Castro, de Cuba. A presidenta Cristina Kirchner foi a primeira a cumprimentar o novo presidente Nicolás Maduro. Pelo seu twitter, ela afirmou, minutos após a divulgação oficial dos resultados pelo Conselho Nacional Eleitoral:

“Parabéns a todo o povo da Venezuela pela exemplar jornada cívica. Parabéns a seu novo presidente, Nicolás Maduro. Memória e gratidão pra sempre ao amigo e companheiro Hugo Chávez. Em seu nome e no do povo venezuelano, concórdia, respeito à democracia, e paz, pela exemplar jornada cívica”.

Cristina ainda tinha mandado o vice-presidente do país, Amado Boudou, que estava ao lado do presidente eleito, no ato de proclamação da vitória. Por sua vez, o presidente da Rússia, Vladimir Putin,  expressou confiança de que, sob a liderança de Maduro, a Venezuela vai reforçar suas relações de parceria estratégica com a Rússia.

O candidato derrotado Henrique Capriles usou seu natural jus sperniandi e pediu a recontagem dos votos, com a qual já concordou Maduro e o Conselho Eleitoral, o qual, na Venezuela, constitui o Poder Eleitoral, tão independente quanto os tradicionais Executivo, Legislativo e Judiciário. Capriles, no entanto, extrapolou ao exigir retificações no modelo econômico e social, incluindo a expulsão dos médicos e professores cubanos, que tornaram possível um dos mais eficazes sistemas educativos e de saúde.

De qualquer maneira, o aparente influxo do apoio popular aos chavistas (calcula-se em um milhão a emigração de votos para Capriles) não significa propriamente uma novidade na política venezuelana.

Recorde-se que, mesmo sob Chávez, o modelo bolivariano experimentou revezes consideráveis na derrota do primeiro referendum para a reeleição, em 2007, por apenas 30 mil votos; nas eleições seguidas para a Assembleia Legislativa, o Parlamento, quando perdeu a maioria de 2/3 para reformar a constituição, e o governo dos Estados mais ricos e fronteiriços.

Logo depois, os chavista se recuperaram e ganharam a eleição presidencial, em 2013, com Hugo Chávez doente e praticamente desenganado, com 54%, contra o mesmo Capriles, que obteve 44%, numa outra vitória apertada, porque no pleito anterior, Chávez tinha alcançado 62%. Na eleição para governador, três meses depois da presidencial, os chavistas recuperaram os Estados importantes e ganharam em 20 das 23 unidades da federação.

Quanto aos riscos de caos e descontrole trombeteado pela mídia e a oposição golpista, é preciso relevar o fato de que Maduro e o Comando Político da Revolução, que também inclui o presidente da Assembleia, Diosdado Cabello, o chanceler Elías Jaua, e Rafael Ramírez, ministro do petróleo, já vinham administrando o país, na prática, há quase dois anos, quando Chávez foi acometido pelo câncer e passava a maior parte do tempo em tratamento em Cuba.

Foram eles que conduziram sozinhos, por exemplo, a última eleição para governador e, no plano econômico, promoveram a desvalorização do bolívar, a moeda nacional, em 42%. O grande desafio será conter as tentativas de desestabilização, que tendem a ser cada vez mais atrevidas e desesperadas nestes seis anos de mandato, a contar a partir de 10 de janeiro último e cuja juramentação será sexta-feira, dia 19, perante o Parlamento.

 

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