O Brasil necessita de um Roberto
Campos às avessas, alguma figura de renome que defenda o Estado como
empreendedor, verdadeiro protagonista e vanguardista do desenvolvimento
brasileiro. Já escrevi sobre essa tema e o retomo, utilizando alguns dados anteriores,
para enfatizar a importância do assunto.
Alguém do estilo da economista
romana Mariana Mazuccato, consultora do governo britânico para o crescimento
estimulado por inovação, que lançou seu livro “Estado empreendedor”, reunindo exemplos de intervenção estatal bem sucedida
que vão da indústria farmacêutica à internet e nano tecnologia. O que falta ao
Estado em geral, segundo a autora,é um melhor trabalho de “marketing” para conscientizar a
população sobre seu papel estimulador do desenvolvimento.
O Estado brasileiro antecedeu ao
surgimento da Sociedade. O assunto é muito debatido, mas as conclusões
aproveitadas são escassas. A modernização do Estado no Brasil passa pela
reformulação dos processos de gerenciamento do aparato administrativo e dos
seus quadros funcionais, sem o que a condição de desenvolvimento do País e sua
projeção no contexto mundial, como protagonista político e econômico, seriam
inviáveis.
Reformar o Estado seria uma
estratégia de ajuste aos interesses globais do capitalismo neoliberal, ou o
ente estatal, por si só, é mutante à revelia dos planejadores e teleologistas,
que não teriam poder além de apenas tentar acompanhar sua “metamorfose
ambulante” (expressão que tomo emprestado do cantor Raul Seixas)?
Uma reforma política sistêmica; a
recuperação do setor industrial e expansão do setor terciário (serviços); a
redução das desigualdades sociais e ampliação da cidadania; o fortalecimento e
a modernização das Forças Armadas e maiores investimentos na ciência e na
tecnologia, em especial a digital, são algumas das medidas sempre mencionadas,
quando se fala das vulnerabilidades do Brasil como Estado.
Quando leio que uma empresa de
consultoria de Cingapura foi contratada pelo então governador do Distrito
Federal, Agnelo Queiroz, para elaborar o planejamento urbano do Distrito
Federal, no horizonte de 2050, indago se não se trata de um mero surto de
soberba, uma jogada de efeito político ou apologia do Minarquismo no coração
político de um país que tem uma das maiores cargas tributárias do mundo, sem a
correspondente contrapartida em bem-estar social... Onde estão os resultados
desse trabalho, dessa consultoria que custou muito aos cofres do Distrito
Federal?
Com, atualmente,24 ministérios,
10 secretarias e cinco órgãos com status de ministério , 123 empresas estatais,
no âmbito da administração federal direta, além de sociedades de economia
mista, autarquias e fundações, na administração indireta, o Brasil tem cerca 10
milhões de servidores públicos, segundo dados do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística-IBGE-. Seis milhões estão nos municípios, três milhões
nos estados e Distrito Federal e 1,1 milhão no serviço público federal.
É expressivo o gigantismo do
Estado brasileiro, em contraponto com a economia informal, conforme pesquisa
divulgada neste ano pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada- IPEA-. O
emprego público representa, segundo apurou esse órgão, nada menos que 21% das ocupações
formais no Brasil, que tem a sua população em torno de 202,7 milhões de habitantes.
Somadas as estruturas das
administrações federal, estadual e municipal e seus servidores, o Estado geral
e a sua burocracia tornam-se base concreta e insubstituível de sustentação do
crescimento do mercado, sendo esse o principal atrativo de investimentos
externos, embora o Brasil esteja ainda situado em 84ª colocação em termos de Índice
de Desenvolvimento Humano-IDH-, avaliado entre 187 países pela Organização das
Nações Unidas-ONU-. Essa posição aponta, em tese, para a necessidade de reforma
do Estado e levanta as questões supramencionadas no início deste artigo, ainda
mais quando se analisa a China e a índia.
Em 2013, a revista “´Época”
publicou notável reportagem constatando que, no Brasil, prevalece o capitalismo
de Estado. De acordo com o levantamento, existiam no país pelo menos 675
empresas de todos os setores com algum tipo de participação ou influência do
governo federal.
São participações diretas ou
indiretas do Tesouro, dos bancos e das empresas estatais ou dos fundos de
pensão (entidades híbridas, inegavelmente na órbita do governo). Dessas, o
governo controla 276, se somados todos os tipos de participação. Levando em
conta apenas as 628 empresas não financeiras, o faturamento soma algo como 30%
do Produto Interno Bruto (PIB). Nas 247 empresas não financeiras controladas
pelo governo, as vendas somam perto de 13% do PIB.
O controle e a fiscalização - com
focos na eficiência dos órgãos, no combate à corrupção e na transparência dos
gastos para a sociedade - são basicamente sustentados por três mecanismos
operacionais.
Essa massa de recursos
financeiros é apurada, em termos de liquidez e créditos de qualquer natureza,
pela Procuradoria-Geral da República, que tem a competência para exercer a
representação judicial, extrajudicial, a consultoria e assessoramento jurídicos
de 155 autarquias e fundações públicas federais. O órgão tem competência também
para inscrevê-las em dívida ativa, para fins de cobrança amigável ou judicial.
O Tribunal de Contas da União
–TCU- é o órgão encarregado da fiscalização contábil, financeira, orçamentária,
operacional e patrimonial da União e das Administrações, quanto à legalidade,
legitimidade e economicidade. Seu trabalho tem sido importante no combate ao
superfaturamento de obras pelas empresas estatais, o que tem transformado o
órgão num bastião de austeridade e principal alvo de muitos brasileiros
interessados em ingressar no serviço público mediante concurso.
Outro dispositivo de controle dos
recursos públicos, por iniciativa dos cidadãos, é a Lei de Acesso à Informação
(Lei 12.527/2011), que, além dos órgãos da Administração Direta e Indireta, se
estende às entidades privadas sem fins lucrativos que recebam recursos públicos
diretamente do orçamento ou mediante subvenções sociais e outros instrumentos.
Cabe, no entanto, destacar as
Comissões Parlamentares de Inquérito –CPIs- como mecanismos de fiscalização à
disposição do Congresso Nacional, em especial para o controle democrático do
processo político e das coisas de interesse público, assim como para contrabalançar a força do Poder Executivo como responsável
principal pelo Orçamento.
Mesmo esses instrumentos não têm
impedido que o Brasil registre casos rumorosos de corrupção em quase todos os
seus governos, transitando entre o fisiologismo político e a cleptocracia, que
sociólogos e cientistas políticos associam a raízes culturais e práticas
elitistas do poder ( coronelismo, patrimonialismo, cartorialismo, clientelismo,
etc.)fincadas na vinda da Família Real, à frente Dom João VI, em 1808, evento
que motivou a frase do jurista, politólogo e senador Afonso Arinos de Mello
Franco: “O Estado antecedeu à formação da sociedade no Brasil.”
Dom João VI construiu a Ordem, na concepção do
sociólogo, historiador e cientista político José Murilo de Carvalho, mas coube
também a José Bonifácio de Andrada e Silva, o “Patriarca da
Independência”, o reconhecimento de
alguns biógrafos como o “fundador do Estado brasileiro”, com direito a busto de
bronze em Nova Iorque (no Bryant Park, em Manhattan).
Dom João VI, José Bonifácio, Dom
Pedro I, Dom Pedro II, Getúlio Vargas, figuras notáveis, lançaram as bases de
um Brasil com DNA estatista, que hoje caminha para a posição de quinta economia
mundial, mas ainda atrelado economicamente ao setor primário. O setor
industrial, como observa Fábio Konder Comparato, nunca se sensibilizou com o
aperfeiçoamento do serviço público, e o setor financeiro muito menos, pois quer
lucros rápidos.
Mas há o efeito da internet nas decisões políticas e econômicas e no controle do aparelho estatal, que tornam o capitalismo de estado mais dinâmico, tanto quanto a iniciativa privada.Quem patrocinaria o aperfeiçoamento do serviço público brasileiro, senão o exercício da soberania popular, a maior participação política dos cidadãos, em especial os internautas, ávidos pelo desenvolvimento do Brasil com a melhoria das condições de vida da população.
Mas há o efeito da internet nas decisões políticas e econômicas e no controle do aparelho estatal, que tornam o capitalismo de estado mais dinâmico, tanto quanto a iniciativa privada.Quem patrocinaria o aperfeiçoamento do serviço público brasileiro, senão o exercício da soberania popular, a maior participação política dos cidadãos, em especial os internautas, ávidos pelo desenvolvimento do Brasil com a melhoria das condições de vida da população.
Conforme observa o jurista Dalmo
de Abreu Dallari:
“Aí estão os pressupostos
fundamentais do Estado Democrático possíveis. Dotando-se o Estado de uma
organização flexível, que assegure a permanente supremacia da vontade popular,
buscando-se a preservação da igualdade de possibilidades, com liberdade, a
democracia deixa de ser um ideal utópico para se converter na expressão
concreta de uma ordem social justa.” (Teoria
Geral do Estado, 1995).
Jovens brasileiros começam a se
interessar pelo serviço público e se preparam para disputar empregos, dentro
dos princípios da meritocracia, não apenas nos poderes Legislativo e Judiciário,
mas também no Executivo, nos Estados e nos Municípios. Atestam esse interesse
crescente pelo serviço público, que oferece estabilidade e boa remuneração, o
número de vagas oferecidas pelo governo federal (mais de 300 mil) e de pessoas
que estudam para os concursos em todo o País (cerca de cinco milhões), segundo
dados publicados na internet.
Brasília consolida-se
irreversivelmente como capital da república, lócus da política e uma das
grandes metrópoles brasileiras, transformando-se em polo irradiador de
desenvolvimento, principalmente para a região mediterrânea. Cumpre, assim, seu
papel de interiorização do desenvolvimento, conforme a visão antecipada de José
Bonifácio, que defendia a transferência da capital do litoral para o interior,
a denominada “Brasílis”, que o Presidente Juscelino Kubitscheck transformou
em Brasília. A corrupção política tem criado uma imagem negativa para a
Capital, mas, nas palavras do novo secretário de Turismo do Distrito Federal,
Jaime Recena, há uma preocupação do governador Rollemberg com a promoção do “turismo
cívico” para amenizar os impactos nacionais do noticiário negativo sobre
diversos fatos.
São Paulo segue liderando a
federação, como locomotiva do desenvolvimento, e adequa-se muito bem à presença
do Estado na economia; o Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul
travam uma disputa silenciosa pela vice-liderança, enquanto os estados do
Norte, Nordeste e Centro-Oeste se transformam em atores decisivos no jogo da
decisão política, em especial na garantia da governabilidade, razão pela qual
garantiram a reeleição da Presidente Dilma Rousseff.
O processo do “Mensalão’ serviu
para comprovar o vigor das instituições jurídicas brasileiras, o mesmo
ocorrendo agora com a situação da Petrobrás. Bobbio afirma que pode haver
Direito sem Democracia, mas não há Democracia sem Direito...E o que tem isso em
comum com o debate sobre o Estado? Muito, no momento em que a globalização e a
tecnologia virtual colocam em cheque a própria identidade dos Estados
Nacionais.
O denominado “crime organizado”,
que se infiltra nos aparatos estatais de muitos países, constituindo “Estados
bandidos”, através da formação dos seus próprios quadros, desde os primeiros
bancos escolares até os cursos superiores, é gerador de focos de corrupção e
requer atenção redobrada dos juristas, políticos e legisladores, com vistas a
escoimar sua influência deletéria às instituições democráticas.
O recente exemplo da Petrobrás,
com prejuízos que ultrapassam a casa dos 88 bilhões de reais em ativos da estatal,
provocando o escândalo da “Operação Lava jato”, apuração de
esbórnia com recursos da estatal envolvendo grandes empreiteiras e políticos de
vários partidos, é um exemplo complementar do “Mensalão” de que a corrupção não
é um atavismo cultural do Estado brasileiro, mas também do empresariado
privado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário