sexta-feira, 3 de maio de 2013

A zona Franca de Manaus vale a pena


Denis Benchimol Minev*

Há algumas semanas, foi publicado um estudo da Consultoria do Senado Federal brasileiro a respeito de supostos custos que a Zona Franca de Manaus (ZFM),capital do Estado do Amazonas, geraria ao país, comentado aqui pelo jornalista Ribamar Oliveira.

Trazia os incendiários argumentos de que a Zona Franca gera muitos custos ao país, deveria ter prazo limitado e é subsidiada por perdas nos demais municípios e estados brasileiros.  É importante notar que este não é um estudo científico; artigos científicos estão sujeitos à revisão por pares, processo no qual o trabalho se sujeita ao escrutínio de especialistas.

O autor, da consultoria do Senado Federal não esteve sujeito a revisão.  Seguem comentários que qualquer revisor teria feito ao trabalho.

O primeiro argumento se baseia no fato de que o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados), após arrecadado, seria distribuído dentre todas as unidades da Federação.  Dado que a ZFM não paga IPI, estaria subtraindo tais valores de todos os cidadãos.  Este argumento é falho.  Incentivos de redução de alíquota não são gastos.  Como exemplo, o IPI de motocicletas é de 35%.  Ou seja, caso alguma empresa escolha produzir motocicletas fora da Zona Franca, teria de pagar 35% de imposto; caso produza em Manaus, não paga IPI.  Dado o faturamento em 2012 de cerca de R$14 bilhões com o polo de duas rodas em Manaus, o autor argumenta que o resto do Brasil está “pagando” de incentivos de IPI R$5 bilhões.  No caso hipotético de ter de pagar R$5 bilhões, é pouco provável que essas indústrias de duas rodas produziriam no Brasil ou mesmo que o número de motocicletas vendidas seria elevado.

Este mesmo argumento vale para o setor automobilístico de São Bernardo do Campo (com IPI muito inferior), ao setor de eletrodomésticos do Paraná, Minas Gerais e São Paulo, dentre outros que tiveram o IPI reduzido ou eliminado em 2012.

Outro caso foi a indústria de informática, que, para nascer no Brasil, precisou da Lei de Informática; coincidentemente, esta lei muito se assemelha à lei da ZFM.  Entretanto, não se vê argumentos de que precisamos descontinuar em breve os incentivos da Lei de Informática; pelo contrário, a Presidente Dilma recentemente aprofundou os incentivos retirando o PIS/COFINS de tablets.

Há muitos casos semelhantes espalhados por todo o Brasil: grandes indústrias nacionais como EMBRAER não pagam quase nada de impostos e ainda são constantemente subsidiadas através de gastos públicos, desde empréstimos do BNDES, isenção de IPI e PIS/COFINS, à sustentação do ITA para gerar mão-de-obra, investimentos que faremos a perder de vista (sem prazo).  Portanto, o argumento do autor de que todo tipo de incentivo só deveria ser válido por tempo limitado não se sustenta.  Se válido, inviabilizaria todos os casos mencionados além da ZFM.

O estudo ainda argumenta que uma das fragilidades da Zona Franca é gerar poucos empregos com baixa remuneração.  O autor esquece que a redução de mão-de-obra no segmento industrial é um fenômeno observado no mundo todo ao longo dos últimos 100 anos.  Isto não é privilégio de Manaus; todas as cidades industriais do mundo (e São Paulo com destaque) têm este desafio.  Ele é imposto por um mundo globalizado onde, para competir, indústrias precisam ser cada vez mais produtivas.

 O fato de a ZFM conseguir grande produtividade com pouco volume de empregados ou salários (5,7% do faturamento industrial é gasto com salários) deveria ser considerado testamento de sua competitividade e sustentabilidade, e não o contrário.

Há outros pontos problemáticos com o estudo: há, por exemplo, um erro matemático de importância.  O autor afirma que o Governo Federal estima arrecadar na região norte R$14 bilhões em 2013, o que seria menos que o total de isenções fiscais estimado em R$22 bilhões (neste caso para a região toda e não apenas Manaus).  Em consulta no site da Receita Federal, nos últimos 12 meses findos em fevereiro de 2013 a arrecadação no Amazonas apenas foi de R$10 bilhões sem contar com a arrecadação previdenciária que é de magnitude semelhante.  O Amazonas tem menos de 20% da população da região, menos de metade do PIB.  Um erro claro de estimativa, provavelmente não intencional, certamente danoso.


Além das deficiências do argumento, há itens adicionais a lembrar: o Amazonas tem hoje 98% de seu território conservado em floresta tropical de pé.  Nenhum outro estado brasileiro, a exceção do Amapá, pode afirmar o mesmo.  E não é porque o Amazonas ama a floresta mais que outros.


 Pode-se mostrar (através de artigos científicos revisados por pares) a forte ligação econométrica do desenvolvimento da ZFM com a redução das taxas de desmatamento no Amazonas.  O Brasil tem escolhas a fazer; a Zona Franca de Manaus é das melhores.


*Denis Benchimol Minev é economista, mestre pela Universidade Stanford e Wharton e ex-Secretário de Planejamento e Desenvolvimento Econômico do Grande Estado das Amazonas.
E-mail: denis.minev@gmail.com


 

 

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