General de Exército Guilherme Theophilo- (Comandante Militar da Amazônia)
Durante essa semana, uma questão me chamou tanto a atenção que decidi trazê-la para a reflexão do leitor. Na quinta-feira, dia 20, observei um comentário de um conhecido que acompanhava o noticiário em seu aparelho celular. Eufóricamente, ele comentava que mais uma vez presenciava uma goleada da Alemanha. Mais uma vez, o Brasil era humilhado. - Sete a um de novo, dizia ele.
Em um primeiro momento, imaginei que suas assertivas eram referentes a uma partida de futebol entre Brasil e Alemanha, tal como foi na traumática semifinal da Copa de 2014, com o vergonhoso placar de 7 x 1 para a Alemanha. Porém, após observar com mais atenção, percebi que, na verdade, aquele jovem fazia uma analogia crítica ao recente acordo de cooperação técnica, assinado entre os governos de Brasil e Alemanha, com o qual aquele país europeu assumiu o compromisso de investir em torno de R$ 200 milhões na conservação ambiental e na regularização ambiental de imóveis rurais na Amazônia Legal e em áreas de transição para o Cerrado.
O acordo foi assinado pelo Executivo dos respectivos países, durante a abertura da Conferência Florestas, Clima e Biodiversidade, em Brasília, naquele dia. Imediatamente, lembrei das inúmeras ações do país germânico na Amazônia.
Entre as mais recentes, destaco a solicitação do Exército Alemão par conhecer o Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS), exatamente no período no qual desenvolvemos ações no contexto da mundialmente conhecida Estratégia da Resistência (visa defender a Amazônia de um provável invasor); o interesse em participar de seminário de doenças tropicais, em Manaus; e os investimentos no recém-inaugurado Observatório Amazônico de Torre Alta, a 200 Km de Manaus, com o objetivo de estudar a emissão de CO2, o ecossistema da floresta, radiação, metano, aerossol e vários outros parâmetros.
Importante destacar que a Alemanha é o 4º maior parceiro comercial do Brasil, ficando atrás apenas da China, dos EUA e da Argentina, estabelecendo em 2014 um fluxo de U$ 20,5 bilhões. Além disso, esse interesse germânico pelo Brasil não é novidade, pois as relações diplomáticas e comerciais entre os dois países tiveram início no século 19 e evoluíram para cooperação em diversas áreas, o que evidencia o interesse estratégico no Brasil a longo prazo.
Contudo, considerando que não há países amigos, mas interesses comuns, devemos acompanhar atentamente essa aproximação a fim de identificar claramente o que está em jogo. Vi que, pouco antes do encontro entre a chanceler alemã e a presidente Dilma Rousseff, a ONG Fundo Mundial para a Natureza (WWF) lançou uma campanha, utilizando formigas do Zoológico de Colônia, na Alemanha, carregando folhas com mensagens pedindo a proteção da floresta amazônica. A WWF é a mesma acusada pelo jornalista alemão Wilfried Huismann, em seu livro Schwarzbuch WWF – Dunkle Geschäfte im Zeichen der Panda (O livro negro do WWF – Negócios obscuros em nome do panda, em tradução livre) de cooperar com alguns dos maiores destruidores do meio ambiente no mundo. A WWF também foi acusada pela ONG estadunidense Global Witness de permitir que a sua marca seja apropriada por empresas que exploram o meio ambiente de maneira predatória, favorecendo e encobrindo as suas atividades sob o selo de “sustentabilidade” da ONG.
Nesse contexto, ressalto o recente alerta do atual Comandante do Exército Brasileiro, General Eduardo Dias da Costa Villas Bôas, em audiência pública na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional (CREDN), sobre os riscos de enfraquecimento da soberania do Brasil sobre a parte nacional da Amazônia. Segundo o Comandante, as situações que limitam a autoridade do Brasil sobre decisões estratégicas para o desenvolvimento da região caracterizam muito bem os “déficits de soberania” que nós estamos admitindo dentro da Amazônia.
Para a reflexão do leitor, acrescento a esse conceito, trechos da Estratégia de Segurança Nacional da Alemanha: “Temos de convencer a América Latina a serem nossos parceiros para "governança global"...; só assim seremos capazes de criar ordem baseada em regras. Temos de intensificar o diálogo político com eles. Cooperação e Desenvolvimento Econômico devem ser melhorados e a integração de segurança levada a um novo nível. Além de ajudar a consolidar a democracia e reduzir as deficiências do Estado de direito, os nossos interesses de segurança na região estendem-se ao combate ao tráfico de drogas, tráfico de seres humanos, o terrorismo e da espionagem industrial.”
Vejamos também trechos da Estratégia de Matéria Prima da Alemanha: “É vital garantir que sejam fornecidos à economia da Alemanha os recursos minerais de que necessita. Isto é especialmente verdadeiro em matérias-primas industriais, um campo em que a Alemanha é altamente dependente das importações. A estratégia de matérias-primas se destina a moldar as políticas adequadas, a fim de ajudar a limitar distorções de mercado e para atenuar os seus efeitos. Ao mesmo tempo, o Governo Federal tem como objetivo colocar um quadro político, jurídico e institucional para promover uma oferta sustentável e competitiva a nível internacional de matérias-primas à indústria alemã.”
Dessa forma, percebemos que as questões ambientais assumem, progressivamente, extrema relevância para as relações internacionais. Indubitavelmente, os efeitos da degradação ambiental vão além dos limites territoriais dos países onde originalmente ocorrem e geram impactos negativos no âmbito regional, continental e internacional. Por essa razão, meio ambiente e soberania nacional interagem de forma interdependente.
Por outro lado, devemos compreender que buscar o desenvolvimento zero é negar o progresso socioeconômico da maioria dos países do planeta e, na prática, preservar os recursos naturais para usufruto da minoria já desenvolvida e industrializada. Em outras palavras, o combate a degradação do meio ambiente não deve ser confundido com desenvolvimento zero. A preservação deve ser buscada continuamente e o desenvolvimento socioeconômico deve acompanhar essa busca. Afinal de contas, as populações ribeirinhas tradicionais da Amazônia e os diversos povos indígenas que nela vivem têm direitos às benesses do desenvolvimento, a exemplo da energia elétrica, da água potável e da internet, igualmente a qualquer cidadão de outras regiões mais desenvolvidas do planeta.
Por fim, pergunto ao leitor: O que é necessário para que essa parceria não seja prejudicial à soberania brasileira, tal qual imaginou o meu colega com sua analogia?
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