sábado, 13 de dezembro de 2014

O establishement americano através dos tempos

                        

·          Manuel Cambeses Júnior

        Desde o final da Segunda Guerra Mundial até meados dos anos setenta do século passado, a representação centro-liberal dominou o pensamento político-estratégico  estadunidense. Muito além do turbulento e efêmero movimento macartista - estilo político-filosófico adotado pelo senador Joseph McCarthy -, que assolou os setores progressistas norte-americanos, durante a primeira metade dos anos cinquenta do século passado, o grosso dos setores geradores de matrizes de opinião e de pensamento provinha, habitualmente, desse atuante grupo.
        O chamado establishment dominava inteiramente, sem rivais, o firmamento político dos Estados Unidos. O mesmo se encontrava conformado por uma coalizão de diversos organismos: centros de análises, pesquisa e investigação, como o Centro de Relações Internacionais de Nova York, fundações privadas como Rockefeller, Ford e MacArthur; meios de comunicação diversos, em que sobressaíam o New York Times, universidades tradicionais da Costa Leste, tais como Harvard, Yale e Princeton. Na essência, o establishment mantinha um respeito quase obsessivo pelas posturas racionais e moderadas e via com horror a intolerância ou o fanatismo, característicos de certas vertentes políticas emanadas do Sul e do Centro-Oeste desse país. Suas posturas, habitualmente, demonstravam ser moderadamente liberais e modernamente reformistas e seu instinto apontava para o centro do espectro político.
        O establishment entrou em crise profunda ao final dos anos sessenta e começo dos setenta, como resultado das imensas contradições internas geradas pela Guerra do Vietnã e ante o voo desatado dos setores liberais. Se bem que, a partir desse momento, sua condição de epicentro de uma ampla coalizão se diluem significativamente, mas os impulsos que davam vida à mesma seguiram de pé. Diários como o New York Times e o Washington Post mantiveram, durante todos esses anos, uma atitude contestatória frente aos excessos da Casa Branca e do Pentágono, da mesma maneira que de Harvard espocavam vozes profundamente críticas. Definitivamente, podemos inferir que a seiva vital que alimentava o pensamento político norte-americano mantinha, sistematicamente, seu vezo progressista.
        Na atualidade, muito pelo contrário, é da direita política desse país que emanam as matrizes de pensamento de maior força. Uma poderosa coalizão de centros de análises, meios de comunicação, universidades e fundações de direita, ocupam o espaço que no passado correspondeu ao establishment. Centros de análises como Enterprise Institute, Heritage Foundation, Center for Strategic and International Studies, Cato Institute e Hoover Institute constituem os lugares de onde emergem as ideias políticas que, fundamentalmente, alimentam o país conservador. Meios de comunicação como Fox, Weekly Standard ou New York Post, de Rupert Murdoch, ou o National Interest e New York Sun, fundados por Conrad Black, se unem à página editorial do The Wall Street Journal ou a diários como Washington Times e a colunistas como Kristol, Krauthammer ou Boot, para criar uma matriz de opinião claramente reacionária.
        De maneira análoga, universidades como Rochester, Chicago ou George Mason e fundações como Scaife ou Bradley, apontam para a margem direita do cenário político e econômico estadunidense. Esta poderosa coalizão conforma o novo establishment. A ela se une, com a força das paixões desatadas, mas não com ideias, um amplo espectro de comentaristas radicais, meios de comunicação evangélicos e web blogs.
        Certamente, diante deste curioso e instigante cenário, podemos entender claramente a virada conservadora evidenciada nos Estados Unidos, nos últimos tempos.
·         Coronel-aviador; membro emérito do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil, membro da Academia de História Militar Terrestre do Brasil, pesquisador associado do Centro de Estudos e Pesquisas de História Militar do Exército e conselheiro do Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica. 

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