quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Cacofonia legislativa para coibir compra de voto

Cacofonia legislativa é o que a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos deputados cometeu ao aprovar projeto-de-lei que estabelece pena de três a seis anos de reclusão (atualmente é de quatro anos) e multas no valor de 100 a 300 dias/multa (o valor das atuais é de 5 a 15 dias/multa) para quem for flagrado comprando voto nas eleições.

A “captação de sufrágio”, assim chamada a compra de voto na Lei 9504/97, nasceu com a política e vai morrer com a política, inspirando toda uma jurisprudência punitiva a respeito e uma vasta literatura sobre o tema “Clientelismo” em Ciência Política.

Não é o aumento do calibre da bala que vai garantir a precisão do tiro nesse caso, que envolve o alvo, o atirador e o juiz da competição... Ou seja, o endurecimento da lei não garantirá a solução de uma questão de princípio ético e moral do sistema representativo no Brasil e alhures.
A lisura do pleito eleitoral tem que ser garantida pelos órgãos de fiscalização com base na legislação em vigor - a referida lei e o próprio Código Eleitoral-, mas ,onde estão as estatísticas de candidatos ou patrocinadores punidos para demonstrar a eficácia dessas normas?

Essa espécie de tolerância zero para tal tipo de ilicitude eleitoral teria algum sentido se fosse suprimida hoje a prática do clientelismo, mas essa prática, que vinha junto com outra similar, como o “voto-de-cabresto” (ambas influenciadas pelo poder político e econômico na cidade e no campo), se encontra arraigada no Brasil como fenômeno cultural. Na República Velha, era uma das pilastras de sustentação das eleições “de bico-de-pena”. Os votos censitários e por procuração, adotados nos períodos colonial e imperial, não constituíam, porventura, modelos de fraudes eleitorais baseadas na “captação de sufrágio”?

Quando está em jogo a conquista do poder político, quase toda fraude e corrupção eleitoral  repousa em geral no poder econômico, seja pela via estatal, onde se concentram os detentores do poder formal, inclusive os partidos políticos, seja pela via societária, onde se encontram os órgãos corporativistas e as empresas privadas, além de outros atores nacionais e internacionais.

Quem é comprado? Na maioria dos casos, o eleitor despolitizado. Quem compra? Uma gama variável de patrocinadores e candidatos ocultos nas fímbrias da impunidade e os próprios detentores do poder governamental, por meio de estratagemas que envolvem a própria política assistencialista. Alguém vai prender e multar o governo?

Em nome da ética e da moral do sistema representativo, só resta fazer uma fiscalização rigorosa com base na legislação (o que não tem surtido efeito), ou estabelecer mais transparência e limites plausíveis no financiamento das campanhas, com base na cultura política nacional ou de cada região. Não tem como remover a cultura por legislação. Antes, essa tem que se ajustar à cultura.

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